Periodização em Bloco: Benefícios e Limitações

Modelo de uma periodização em bloco

As primeiras publicações propondo modelos alternativos de periodização do treinamento surgiram há cerca de 35 anos. Naquela época, muitos treinadores de vários esportes e diferentes países começaram a utilizar o termo “bloco de treinamento” para caracterizar os intervalos de treinamento com uma alta concentração de cargas de trabalho especializadas.

A ideia que deu origem à Periodização em Bloco (PB) foi proposta e implementada por diferentes pesquisadores mais ou menos ao mesmo tempo. Duas versões básicas de planejamento e implementação da PB existem simultaneamente desde 1980:

  • o modelo de Treinamento Concentrado Unidirecional, proposto pelo professor J. V. Verkhoshansky, e
  • a abordagem de Periodização em Bloco Multialvos para a preparação do atleta, a qual foi desenvolvida de forma mais completa por Vladimir Issurin, tema deste post.
A premissa geral da Periodização em Blocos – uma alta concentração de cargas de trabalho especializadas para estimulação de treinamento mais específico – não é monopólio de um autor.

Como o treinamento através da PB ainda é relativamente novo, muitos significados contraditórios e até mesmo errôneos podem ser encontrados em bancos de dados da Internet, fóruns ou blogs sobre treinamento. Já publicamos um post introdutório sobre a PB e o modelo tradicional de treinamento, também conhecido como Periodização Linear, clique aqui para ler.

Conceitos gerais e princípios do sistema de treinamento multialvo da periodização em blocos

A estrutura principal da PB é um bloco de treinamento com duração de 2 a 4 semanas, que corresponde a um único mesociclo. Cada mesociclo de bloco inclui cargas de trabalho altamente concentradas e direcionadas a um número mínimo de modalidades que deverão ser treinadas.

Ao contrário dos programas tradicionais “mistos” direcionados ao trabalho concorrente de muitas modalidades de treinamento, o sistema de PB propõe o desenvolvimento consecutivo de habilidades especificas com o objetivo de otimizar a interação e superposição entre elas.

A taxonomia dos mesociclos na PB pressupõe a sua categorização em três tipos:
  • acumulação – se concentra nas habilidades básicas como resistência aeróbia, força muscular e coordenação geral;
  • transmutação – se concentra em habilidades específicas do esporte como cargas de trabalho anaeróbias de alta intensidade, resistência de força e técnica adequada;
  • realização – se concentra na recuperação e polimento para a obtenção do pico na competição ou testes.

A lógica dos mesociclos

Em cada mesociclo de bloco busca-se trabalhar com modalidades de treinamento compatíveis para evitar respostas fisiológicas conflitantes. Ou seja, as modalidades de treinamento não compatíveis são separadas em diferentes mesociclos de bloco.

De modo geral, os três mesociclos de bloco citados acima formam um ciclo de treinamento que dura cerca de 2 meses e termina com a participação em uma competição ou período de testes.

Para a PB, os efeitos residuais do treinamento, são de suma importância quando várias habilidades atléticas são desenvolvidas consecutivamente. O efeito residual do treinamento é definido como “a retenção de mudanças no estado corporal e habilidades motoras após a cessação de um programa de treinamento além de um determinado período de tempo” (Counsilman BE, Counsilman J., 1991),

Superposição dos efeitos residuais durante os mesociclos de treinamento na periodização em bloco.
Figura 1 – superposição dos efeitos residuais durante os mesociclos de treinamento na periodização em bloco.

A base biológica dos mesociclos de bloco explora teorias fundamentais da adaptação humana, como:

  • regulação homeostática, que tende a proteger a estabilidade das constantes biológicas mais rígidas (Cannon W., 1929), e
  • adaptação ao estresse, que fundamenta a mobilização de extraordinários recursos humanos (Selye H., 1950).

O desenvolvimento de habilidades atléticas básicas (que são os alvos no mesociclo de acumulação – resistência aeróbia, força muscular e coordenação geral), é subordinado por mecanismos homeostáticos. Enquanto que a execução de um programa glicolítico altamente intensivo (mesociclo de transmutação) exige e desencadeia reações de adaptação ao estresse.

Vantagens da periodização em bloco

Segundo Issurin (2009), a PB tem as seguintes vantagens:

  • o volume total de treinamento pode ser reduzido significativamente, reduzindo também o risco de overtraining dos atletas;
  • um plano de treinamento que fornece mais performances competitivas também facilita a participação bem-sucedida em várias competições ao longo da temporada;
  • o monitoramento e o controle da preparação podem ser eficazes porque cada diminuição drástica na habilidade de um atleta pode ser avaliada em cada mesociclo;
  • o programa de nutrição e recuperação de atletas pode ser alterado adequadamente, dependendo do tipo de treinamento predominante, e
  • o plano anual que inclui múltiplas fases de treino proporciona condições mais favoráveis para alcançar o máximo de resultados durante a principal competição de uma temporada.

Cuidados a serem tomados

Como já mencionamos, a periodização em bloco também é baseada no chamado efeito residual do treinamento. Issurin se baseia em autores que afirmam que as habilidades são mantidas por um determinado período de tempo após o término do exercício (de 5 a 35 dias). E esse tempo não é o mesmo para todas as habilidades motoras (Figura 2).

Figura 2 – Efeitos residuais do treinamento para as habilidades: resistência aeróbia, força máxima, resistência anaeróbia, resistência de força e capacidade alática.

Porém, outros estudos (Hargreaves, 1995; Wilmore & Costill, 2004 apud Koprivica, 2012) sugerem que este cenário pode ser mais problemático e que as perdas podem ocorrer em menos tempo. Eles mostraram que em 1 ou 2 semanas após o término do trabalho, a atividade das enzimas oxidativas e glicolíticas diminuiu, a resistência muscular localizada reduziu e as habilidades adquiridas foram afetadas.

Sistemas biológicos antes altamente adaptados pelo treinamento, devido à inatividade, agora estão sujeitos ao processo de desadaptação. Essas habilidades do conjunto não são reduzidas de uma única vez, mas é um processo gradual e diferenciado. A interrupção em um nível de uma habilidade muda a conformidade e as relações de várias habilidades motoras, especialmente aquelas que são altamente correlacionadas. Isso pode afetar, não apenas positivamente, mas negativamente também, outras habilidades e o seu nível técnico e tático.

Considerações finais

Conceitos de coaching como bloco, estrutura de bloco e periodização em blocos se tornaram uma realidade no esporte contemporâneo e uma parte indispensável da teoria do treinamento.

O objetivo de aumentar a estimulação do treinamento dentro da estrutura da teoria tradicional levou a uma elevação dramática na magnitude da carga de trabalho e à disseminação de tecnologias farmacológicas prejudiciais.

Uma das premissas da PB é que o sequenciamento de mesociclos de bloco com foco na combinação apropriada de modalidades de treinamento compatíveis, exige a interação correta e a sobreposição de efeitos de treinamento produzidos por todo o programa de preparação.

Quando uma abordagem de periodização integrada é usada, com base na pesquisa científica atual e no entendimento, ainda assim, há a necessidade de planejar e abordar os componentes centrais da preparação atlética para maximizar e otimizar o desempenho futuro, em vez de aderir a uma metodologia de periodização central.

Em artigos futuros, vou apresentar dados de estudos controlados onde a periodização em bloco em diversos esportes foi aplicada. Em muitos destes estudos ficará claro também a modelagem dos conceitos dessa teoria de treinamento para uma abordagem mais integrativa, não ficando engessado aos conceitos.

Até o próximo!
Referências

ISSURIN, V. B. Benefits and Limitations of Block Periodized Training Approaches to Athletes’ Preparation: A Review. Sports Medicine, v. 46, n. 3, p. 329–338, 2016.

ISSURIN, V. Block Periodization. Breakthrough in Sport Training. 1. ed. [s.l.] Ultimate Athlete Concepts, 2008. v. 48

KOPRIVICA, V. Block Periodization – A Breakthrough or a misconception. Sportlogia, v. 8, n. 2, p. 93–99, 28 dez. 2012. Disponível em: http://www.sportlogia.com/no6engl/1.html.

Counsilman BE, Counsilman J. The residual effects of training. J Swim Res. 1991;7:5–12.

Cannon W. Organization of physiological homeostasis. Physiol Rev. 1929;9:399–431.

Selye H. The physiology and pathology of exposure to stress. Montreal: ACTA Inc., Medical Publishers; 1950.

2 pensamentos em “Periodização em Bloco: Benefícios e Limitações

  1. Conteudo excelente. Me fez entender melhor a metodologia de treino que tenho seguido com a Tetris.

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